Por Walmir de Albuquerque Barbosa. Jornalista Profissional. Manaus, 17/10/2025
Por volta das 14 horas do dia 09 de outubro, no Brasil, tomamos conhecimento de que um acordo (costurado pelos negociadores do Catar, Egito e Turquia) havia conseguido acertar o fim da guerra na Faixa de Gaza que se prolongava há dois anos, ceifando as vidas de mais de 65 mil palestinos e um número desconhecido de soldados israelenses, além de mortos no atentado terrorista perpetrado pelo Hamas e que deu origem à guerra como vingança dos israelenses e com o objetivo de resgatar os mais de 200 reféns nas mãos do inimigo. Todos nós acompanhamos em tempo real o desenrolar das batalhas com mísseis de lado a lado, sendo que a maioria dos artefatos aéreos carregados com bombas destinadas ao território de Israel foram interceptados pela máquina de defesa que cria um escudo de proteção do território ocupado pelo povo judeu; envolvendo, ainda, parte da Cisjordânia, ocupada por assentamento de colonos judeus que não reconhecem as terras como reservadas a um futuro Estado Palestino, prometido desde a mesma data da fundação do Estado de Israel para que os dois povos vivessem em paz. Em desvantagem de defesa e paridade de armas, as tropas sob o comando do Hamas (que governa o território de Gaza) foram perdendo praticamente o controle da situação e os aliados, enquanto a artilharia de guerra por ar, por terra e mar do exército israelense destruiu praticamente tudo que lá existia, obrigando a população sobrevivente a deslocar-se em direção ao sul, já na fronteira com o Egito. O que ficou para trás são: escombros de tudo que foi o abrigo do povo que ali vive há mais de cinco mil anos, mesmo antes da chegada dos judeus à “Terra Prometida por seu Deus”; e a tragédia que chega aos nossos olhos, às nossas consciências e aos tribunais internacionais como mais um genocídio praticado contra os povos mais fracos e abandonados da nossa humanidade.
É preciso rememorar os fatos situados no momento, mas estes não dão conta da história de um povo, de uma cidade e, sobretudo, de uma memória de massacres, ocupações, destruições, reconstruções e recomeços civilizatórios. Gaza foi, nesses cinco mil anos de história, bem maior que os que a invejam e tentam exterminá-la. Genericamente nominados como Palestinos, foram no início Cananeus, misturados a Aveus, seus vizinhos, e aos invasores Caftoritas, ancestrais dos Filisteus que ocuparam a área e dominaram a região e suas populações e, por suposto, inauguraram as divergências inicialmente com os Egípcios e depois com os Hebreus, origem primeva dos judeus de hoje. Gaza, nesses tempos antigos, foi destruída e reconstruída, diz sua história, e sempre apresentava um novo fulgor. Entretanto, a ira de Israel é bíblica: os profetas Amós, Jeremias e Sofonias profetizaram a destruição da cidade, com o fogo chegando aos pés de suas muralhas monumentais.
A localização privilegiada como porta aberta para as civilizações mais ricas e imponentes do Oriente Médio atraiu os Assírios de Nabucodonosor, os Persas de Ciro, os Macedônios de Alexandre, o Grande. Fez parte do Império Bizantino até ser conquistada pelo Islã; parte do Império Otomano, depois. Após a I Guerra Mundial, passa para as mãos do Império Britânico e, posteriormente, é retomada pelos Egípcios, que a perdem para Israel na Guerra de 1947 até tornar-se, por decisão da ONU, a zona reservada ao futuro e inalcançado Estado Palestino. A verdade é que, em um espaço de 365 Km², temos um amálgama de civilizações, de culturas e de religiões que se confrontam com a história de seus povos e o fado de uma humanidade atravessada pelo ódio.
Ao ver aquela multidão perambulando entre os destroços, removendo-os com as próprias mãos em busca dos restos mortais de seus filhos, não nos damos conta de que os falcões da guerra e da perversidade já estão abrindo as gavetas com os novos planos para a Gaza do Século XXI. É verossímil que uma nova estátua, loira, envolta em folhas de ouro, profane os textos sagrados do tempo dos Filisteus e emerja dos aterros onde jazem os corpos das 65 mil almas que ali ficaram a testemunhar o último massacre da história. Ao que nos parece, Gaza não foi feita para contar o seu passado, ele está enterrado sob camadas de cada umas das destruições pretéritas!

(*) Professor Emérito da Universidade Federal do Amazonas (UFAM, 2015), doutor e mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), e graduado em Comunicação Social pela UFAM (1973). Professor dos Programas de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia e em Ciências da Comunicação, ambos da UFAM. Atuou como docente da instituição entre 1974 e 2002, período no qual também exerceu a função de Reitor (1997–2001), tornando-se o primeiro jornalista a ocupar o cargo de reitor de uma universidade pública no Brasil.
Na Universidade do Estado do Amazonas (UEA), atuou em programas de formação de professores e no Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental (2003–2012), além de ter exercido o cargo de Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa (2004–2007). É jornalista profissional e referência na área da Comunicação e Educação na Amazônia.